Pesquisa em área florestal ajuda a assegurar água para população

Segundo o Instituto Florestal, cobertura florestal em bacias hidrográficas promove regularização de rios e melhora na qualidade da água

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A presença de cobertura florestal em bacias hidrográficas promove a regularização do regime de rios e a melhora na qualidade da água. A constatação foi comprovada por meio de trabalhos desenvolvidos pelo Instituto Florestal (IF).

Os trabalhos atestam a importância do Programa Nascentes, que alia a conservação de recursos hídricos à proteção da biodiversidade. “As pesquisas são fundamentais porque vão orientar onde é mais importante restaurar para avaliarmos o impacto e assegurarmos que tenha água paras as pessoas”, comenta Helena Carrascosa, coordenadora do Programa Nascentes na Secretaria de Estado do Meio Ambiente.

A relação entre a floresta e a água foi a base das teses de doutorado dos pesquisadores científicos da Seção de Engenharia Florestal do IF, Valdir de Cicco, Francisco Arcova e Maurício Ranzini, que elucidaram dúvidas e provaram com números as suas proposições.

“As bacias hidrográficas recobertas por vegetação florestal são as que oferecem água com boa distribuição ao longo do ano, e de melhor qualidade”, enfatiza Arcova, engenheiro florestal, doutor em Geografia Física pela Universidade de São Paulo, e no IF desde 1985.

Foi constatado que parte da água da chuva é retida pelas copas das árvores, evaporando em seguida em um processo denominado interceptação. A taxa de evaporação varia com a espécie, idade, densidade e estrutura da floresta, além das condições climáticas de cada região.

“Em florestas tropicais, a interceptação varia de 4,5% a 24% da precipitação, embora tenham sido registrados valores superiores a 30%”, explica Francisco, antes de enaltecer o Laboratório de Hidrologia Florestal Walter Emmerich, do IF, instalado em 1982 no Núcleo Cunha, do Parque Estadual da Serra do Mar, onde desenvolveu estudos em trabalhos conjuntos com o pesquisador que dá nome à instalação.

O laboratório é referência quando se trata de hidrologia florestal. Tanto é que, todos os anos, recebe dezenas de alunos de diversas universidades brasileiras e internacionais em cursos ministrados pelos pesquisadores do IF.

As pesquisas realizadas em Cunha estimam o valor de 18% de interceptação. O restante da água alcança o solo florestal por meio de gotejamento de folhas e ramos ou escoando pelo tronco de árvores. No solo, a água infiltra-se ou é armazenada em depressões, não ocorrendo o escoamento superficial para as partes mais baixas do terreno, como aconteceria em uma área desprovida de floresta.

“O piso florestal é formado por uma camada de folhas, galhos e outros restos vegetais, que lhe proporciona grande rugosidade, impedindo o escorrimento superficial da água para as partes mais baixas do terreno, favorecendo a infiltração. Também a matéria orgânica decomposta é incorporada ao solo, proporcionando a ele excelente porosidade e, consequentemente, elevada capacidade de infiltração”, informa Ranzini, doutor em Ciências da Engenharia Ambiental pela USP de São Carlos, engenheiro florestal e no IF desde 2005.

Uma parcela da água infiltrada contribui para a formação de um rio por meio do escoamento subsuperficial, e outra é absorvida pelas raízes e volta para a atmosfera pela transpiração das plantas. “A interceptação e a transpiração, ou a evapotranspiração, fazem a água da chuva voltar para a atmosfera não contribuindo para aumentar a vazão de um rio”, diz.

Em florestas tropicais, a evapotranspiração varia de 50% a 78% da precipitação anual. Na pesquisa realizada em Cunha, esse número é de aproximadamente 30%. Os pesquisadores explicam que o remanescente da água infiltrada movimenta-se em profundidade e é armazenado nas camadas internas do solo e na região das rochas, alimentando os cursos de água pelo escoamento de base, isto é, do subsolo onde se localizam os lençóis freáticos.

Em florestas tropicais, a produção hídrica nas microbacias varia de 22% a 50% da precipitação. “Em Cunha, onde a evapotranspiração anual da Mata Atlântica é da ordem de apenas 30%, a produção de água pela microbacia é de notáveis 70% da precipitação”, afirma Francisco.

Esse mecanismo, em que a água percola o solo e alimenta gradualmente o lençol freático, possibilita que um rio tenha vazão regular ao longo do ano, inclusive nos períodos de estiagem. Nas microbacias recobertas com mata atlântica em Cunha, o escoamento de base é responsável por cerca de 80% de toda a água escoada pelo rio, fato que proporciona a elas um regime sustentável de produção hídrica ao longo de todo o ano.

O estudo do IF demonstra ainda que em uma bacia sem a proteção florestal ocorre justamente o contrário, pois a infiltração da água da chuva no solo é menor para alimentar os lençóis freáticos. O escoamento superficial torna-se intenso fazendo com que a água da chuva atinja rapidamente a calha do rio, provocando inundações. E, nos períodos de estiagem, o corpo-d’água vai minguando, podendo até secar.

Um outro fator drástico é que, enquanto nas bacias florestadas, a erosão do solo ocorre a taxas naturais, pois o material orgânico depositado no piso impede o impacto direto das gotas de chuva na superfície do solo, nas áreas desprovidas de vegetação há um intenso processo de carreamento de material para a calha do rio aumentando a turbidez e o assoreamento dos rios.

Segundo Maurício, na microbacia recoberta com Mata Atlântica em Cunha, a perda de solo no rio é da ordem de 162 kg/hectare/ano. “Esse valor é muito inferior à perda de solo registrada para o estado de São Paulo, que varia de 6,6 a 41,5 t/hectare/ano, dependendo da cultura agrícola, algo como 12 toneladas num campo de milho, 12,4 toneladas numa área de cana-de-açúcar, chegando a até 38,1 toneladas numa plantação de feijão”, alerta.

A floresta representa muitos outros benefícios para os sistemas hídricos. Contribui, por exemplo, para o equilíbrio térmico da água, reduzindo os extremos de temperatura e mantendo a oxigenação do meio aquático. Promove, ainda, a absorção de nutrientes pelas árvores, arbustos e plantas herbáceas evitando a lixiviação excessiva dos sais minerais do solo para o rio.

Diante do estudo apresentado pelo IF, Carrascosa lembra que é preciso avançar. “Os resultados das pesquisas precisam ser usados para o desenvolvimento de políticas públicas, é o que tentamos e estamos fazendo no Programa Nascentes”, diz a coordenadora, antes de citar estudo que vem sendo produzido pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas justamente para mensurar os ganhos e perdas com o investimento em infraestrutura verde.

“A água armazenada no solo não causa problema e mais água no solo não precisa fazer mais obras. Mas precisa entender o papel da infraestrutura verde. Precisa de mais pesquisa de valoração econômica, para entendermos quanto se perde e quanto se ganha para a tomada de decisão”, conclui Carrascosa .

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